quarta-feira, abril 13, 2005

Perdoar Helena

2. (recobrando)
É estranho. O que eu sinto agora é que estamos sempre a um passo, quer nos dirijamos para um lado ou para outro... quer se trate da vida ou da morte. E a isso não se pode fugir... Por mais branda que sopre a brisa, por mais branda... a noite penteia as glicínias com seu pente aguçado.

1. (pausa)
Sabes o povo berbere... os nómadas...

2. Sim...

1. Estamos demasiado ligados à ideia de viagem... sair pelo mundo e tornar à mesma casa, na mesma rua, no mesmo bairro de Ítaca, de Nova Iorque... O nomadismo não é uma viagem assim...

2. Continue.

1. O nomadismo é uma viagem sem fim...

2. E...[...]

1. Os que viajam, voltam para trás... regressam à sua rua, aos seus tectos amados, aos olhos de Penélope... Os nómadas...

2. E os nómadas?

1. Os berberes dizem que os nómadas desposam o vazio... falam das núpcias com o vazio...

2. Não compreendo.

1. Mas queres compreender?

2. Juro que quero... Mas...

1. Mas... o quê?"

José Tolentino Mendonça
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